Colaboradores e funcionários

por Ulysses Monteiro Duarte*

As relações de trabalho estão passando por profunda transformação. Sobretudo na área de tecnologia. Contracheque, carteira assinada, fundo de garantia estão deixando de ser inerentes à relação empregatícia. O próprio conceito de emprego está ameaçado. O termo empregado está sendo substituído por um mais genérico: colaborador. A grande questão é saber exatamente o que está mudando ou o que está apenas com novo nome.

 

As causas

Dentre as muitas causas para esta pequena revolução, vamos destacar algumas:

 

Redução de custos

Cada vez mais as empresas precisam enxugar custos, seja para manterem-se competitivas, seja simplesmente para se manterem vivas. Daí coloca-se como gordura a ser cortada o conjunto de encargos sociais. Algumas vezes a empresa gasta com o funcionário o dobro do seu salário. O pior é que a maior parte deste bolo não vai diretamente para o profissional. Então , deve estar concluído o caro leitor, é bastante lógica a fuga desses encargos. Será que é tão lógico assim ? Talvez o maior problema não seja a existência do encargo, mas sim sua gestão.

Vamos excluir as férias e o décimo-terceiro por dois motivos: são recursos que vão diretamente para o profissional e ,em muitos casos, continuam existindo numa relação de contratação. Fazendo uma análise rápida dos outros encargos verificamos que são nobres em essência, mas pobres efetivamente:

 

Legislação trabalhista

Nossa estrutura social de modo geral já é paternalista. Esta característica fica mais evidente na legislação trabalhista, que parece muito mais uma forma de proteção ao trabalhador, como se todo trabalhador fosse uma vítima e todo empresário, um vilão. Evidente que há muitos empresários vilões e muitos trabalhadores vítimas desses, mas isto não é, ou não deveria ser, a regra. Muitas empresas tem simplesmente fobia da justiça do trabalho. Fobia esta que não cabe aqui discutir se é justificável ou não.

 

Instabilidade do mercado

A instabilidade em que vivemos traz a motivação e a arma para as empresas adotarem a contratação ao invéz do modelo "tradicional" de trabalho. A motivação vem do fato de facilitar a gestão de recursos humanos por demanda, ou seja, se há trabalho, há funcionário. Se não há....

A arma vem do desemprego crescente, que diminui o poder de barganha dos profissionais.

 

Objetivo e pretexto

O discurso a favor do trabalho por contratação vem sempre recheado de palavras de impacto como modernização, flexibilidade e espírito empreendedor. A grande questão é verificar se o discurso está fiel à pratica. Não é difícil encontrar casos que oficialmente a relação de trabalho mudou, mas na prática do dia a dia não há grande alteração. A empresa reduz seus custos e flexibiliza o gerenciamento de recursos humanos, mas o tratamento dispensado ao profissional é o mesmo. Inclui-se aí a obrigação de cumprir horários, seguir hierarquias, ter um cargo, ser promovido, etc.

Outro grande problema é que os profissionais algumas vezes não fazem um bom negócio ,financeiramente falando, na hora de fechar o contrato (na verdade, negociar o salário). A empresa deixa de pagar alguns encargos, mas pouco desses são revertidos para o profissional. Um depósito mensal um pouco maior na conta corrente traz a ilusão de que o profissional está ganhando mais, o que ,na maioria dos casos, não é verdade.

 

Simples fraude

Muitas das contratações que temos hoje são simples e puramente fraude. Não estão sujeitas à legislação trabalhista, mas todo o resto é o mesmo. Muitas vezes não há sequer um contrato entre a empresa contratante e a empresa que o profissional abriu para "emitir nota". Muitas vezes de empresa só há o nome e um CGC e as artimanhas para engordar os rendimentos, como o registro em cidades que cobram baixo ISS ou as brechas legais para fugir da mordida do leão, pesadelo dos assalariados. Este terreno também é fértil para outro tipo de fraude: as falsas cooperativas, que aparecem prometendo descomplicação e economia e , algumas vezes, acabam trazendo dor de cabeça para cooperados e contratantes.

 

Dias melhores virão

O objetivo deste artigo não é condenar o atual processo de alocação de mão de obra, nem defender a contratação via CLT, com sua geração de impostos e coisa e tal. A grande questão é aproximar a realidade do discurso. Fazer com que a relação por contratação estimule o espírito empreendedor do profissional, troque a relação trabalhista por uma relação de real parceria. E ,é claro, que ambas as partes colham os frutos desta parceria. O que não estar correto é colocar um anúncio no classificados de empregos e na entrevista perguntar se o candidato tem empresa aberta ou este fazer um psicotécnico. Afinal classificados de empregos não são um balcão de comércio e empresas não tem psique. No mais, estando bem para ambas as partes...

 

Para pensar...

O que dá mais retorno um MBA na FGV ou um certificado Microsoft Solution Developer ?

 

Notas:

  1. Excluir pode até ser mais simples e correto, mas com o perdão dos gramáticos, "incluir fora dessa" é muito mais sonoro e simpático.
  2. Exemplo clássico é a tentativa de utilizar esses recursos para compra de casa própria. A burocracia é tanta, que no fim parece que o candidato está pedindo um favor ao banco. Isso se este cumprir todas as exigências como não ter outro imóvel na cidade, etc. e tal.

(OBS: Não revisado)

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(*)  Ulysses Monteiro Duarte (https://www.umd.niteroi.net   - ulysses@niteroi.net)  é Engenheiro de Computação com atuação em desenvolvimento de sistemas.